quarta-feira, 25 de novembro de 2009

CONTOS DO COTIDIANO

Desconcertos da vida, na vida de um professor

Rabiscos, linhas tortas, riscos.
Era a única coisa vista por Helena no momento em que se sentou em sua escrivaninha para estudar o assunto da aula que iria ministrar no dia seguinte.
A sua cabeça estava confusa, não conseguia sequer associar os conhecimentos que já havia se apropriado em situações anteriores para usá-los como ponto de partida. Realmente era um estado nervoso que sua mente não abria espaço para pensar em nada. Somente lembrava da cena em que o seu namorado abraçava-se à sua melhor amiga dizendo que a amava. “Foi uma traição dupla”. Resmungava baixinho.
A sua mente voltou-se para o dia em que encontrou Felipe. Estavam juntas, ela e Marília, numa festa de encerramento do ano letivo da escola. Felipe chegara acompanhado de dois amigos, cada um com suas namoradas. De início, logo percebeu o interesse dele em conhecê-la. Pensou que talvez a amiga também tivesse se interessado, mas não hesitou em deixar o espaço aberto para Felipe. É bem verdade que se conheciam a pouco tempo, mas o seu corpo, a sua mente, o seu coração não esqueciam nenhum dos momentos em que esteve do lado dele.
De repente, a porta da biblioteca se abre e Felipe adentra o ambiente, corre para abraçá-la Helena cai em pranto, empurrando-o desesperadamente. Enquanto o empurrava, também esbravejava chamando-o de traidor. O rapaz franzia a testa sem entender nada. Tentava falar, mas a moça, tomada pelo ódio, não o escutava. Ele não sabia o que fazer. Simplesmente, Felipe se virou e saiu sem dizer nada.
Helena cai novamente em prantos. Desta vez mais desesperada. Não entendia por que mesmo sabendo de tamanha traição, ainda sentia saudades de Felipe. Consciente de que precisava descansar, talvez dormir para, pelo menos esquecer um pouco a situação. Abriu a gaveta da escrivaninha, pegou um comprimido, tomou e seguiu para o quarto. Dormiu a tarde inteira. Acordou somente à noite, no momento em que sua irmã batia à porta falando que Marília havia ligado para ela e deixado o recado para que a retornasse a ligação.
Helena, ainda angustiada, levantou-se, abriu a porta do quarto e perguntou se Marília havia dito mais alguma coisa. Fernanda respondeu que não. Com o coração machucado, Helena meditava se ligava ou não para Marília. Por fim decidiu-se, vou ligar e dizer poucas e boas àquela fingida. Andou rápido em direção ao telefone e discou o número de Marília. Ficou apreensiva quando um rapaz atendeu a chamada. Era uma voz parecida com a de Felipe, mas não era ele. Disso ela tinha certeza.
Pediu para que o rapaz chamasse Marília e ele perguntou quem desejava falar. Quando Marília respondeu, logo o rapaz se adiantou e disse: “Meu nome é Fábio. Sou irmão de Felipe, gostaria muito de encontrar você agora e esclarecer-te que está enganada a respeito do meu irmão”.
O coração de Helena saltou ao ouvir isso. Uma confusão imensa se instalou em sua alma. Pensava: “Felipe com um irmão? Se conheciam há seis meses e ela não sabia disso...não seria mais uma mentira? Desligou o telefone, saiu batendo a porta do quarto, desceu as escadas, pegou o carro e saiu em disparada para a casa de Marília. Ao chegar lá encontrou os três: Felipe, Marília e um outro rapaz, muito parecido com Felipe. Dava até para confundir os dois, se olhasse ligeiramente.
Helena parou em frente aos três e logo as coisas foram clareando. Agora compreendia que não tinha nenhuma traição. Fábio logo se apresentou e Marília, adiantando-se, começou a esclarecer tudo: falou que Felipe e Fábio eram irmãos, mas não se conheciam. Que agora estavam juntos por que ela já conhecia Fábio. Aliás, ele era aquele rapaz que as duas sempre conversavam sobre ele, mas que Marília nunca tinha tido tempo de conhecê-lo.
As lembranças foram clareando na memória de Helena e ela, agora em prantos que se misturavam com alegria e culpa, se dirigia a Marília e a Felipe para desculpar-se. Na verdade, fora Marília a mediadora do encontro entre os dois irmãos, que há muito tempo estavam separados, desde o acidente com um barco em alto mar, momento em que morreram pais deles.
Os quatro, agora amigos e com grandes chances de se tornarem parceiros inseparáveis, se abraçam e comemoram com alegria o fato do reencontro. E Marília, depois de tudo esclarecido, da comemoração vivida com seus parceiros, volta para casa, senta-se na escrivaninha e abre a mente para planejar a sua aula.


Maria Mônica de Freitas

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